O Patim: assassinato
Mostrando postagens com marcador assassinato. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador assassinato. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Camata: o homem, o político e o mito

18.10.21
Camata: o homem, o político e o mito

Camata soube, como ninguém, falar a linguagem das pessoas simples. E, simbolicamente, deu a isso um signo: estradas em todos os municípios. “Isso aqui foi Camata quem fez. Antes dele era poeira ou barro”. Esta era uma justificativa comum para as seguidas enxurradas de votos a Gerson Camata destinados para senador e, depois, também para sua mulher Rita a deputada federal.

Depois dele, ninguém mais deu a mesma importância à interligação dos municípios com tal entusiasmo. O sonho do homem do interior era com o asfalto e, com o “Taliano”, o teve. Vieram, no presente século, algumas tentativas de reeditá-lo, mas o mito sobrevive ao tempo. Desde sua primeira eleição a vereador, ainda nos anos 60 em Vitória, jamais perdeu uma eleição.

No trato pessoal, era insuperável. Não o conheci nos tempos da rádio Vitória – vinte anos nos separam na idade e quando cheguei de Alegre ele já era deputado federal e fez a lei que beneficiou a mim e a toda a minha geração, que conseguiu registro profissional, mesmo sem o curso superior da área. E ainda tínhamos a aposentadoria especial.

No dia 13 de março de 1979 nossa profissão estava regulamentada, com piso de cinco salários mínimos, jornada de cinco horas e com a possibilidade do registro provisório, mais tarde transformado em definitivo (Decreto 91.902/85), a quem comprovasse o exercício da profissão dois anos antes do Decreto 83.294/1979. Isso foi trabalho do Camata.

O relacionamento de Gerson Camata com os jornalistas “das antigas” era de colega. Ele até votava nas eleições sindicais. E não há quem faça parte dessa geração e que não colecione algumas boas histórias com ele, um emérito contador de causos. Aliás, como registrou no velório o ex-deputado José Carlos Gratz, o Camata não tinha a menor vergonha em contar piadas repedidas pela enésima vez – e o fazia como se fosse a primeira vez.

Camata filava cigarros com quem estivesse por perto, nos tempos em que ainda fumava, e quando não queria continuar dando informação, simplesmente começava a contar causos e arranjava um motivo para ir saindo de fininho. Senti isso na pele quando o entrevistava como chefe da sucursal de A Gazeta em Colatina nas tensões convencionais do PMDB para as eleições municipais de 1988.

Deixo por último o registro do ano de 1982. Era a volta da eleição para governador, início da redemocratização brasileira. Camata disputava a indicação do MDB com Max Mauro num lotado Colégio do Carmo. Eu estava lá, assim como centenas de jornalistas e radialistas, e militantes emedebistas. Camata venceu, para desconforto de Max, que, entretanto, não negou-lhe apoio e, em 1986, com Gerson candidato ao senado, lá veio o ex-prefeito de Vila Velha com a fatura: “Agora é Max”. E foi mesmo.

Aqui vale um registro do valor de uma amizade. Marquinho Vicente fazia campanha para Carlito Von Schilgen, o escolhido de Eurico Rezende, em 1982, contra todos os prognósticos de que Élcio Álvares seria um candidato mais viável. Eu, como a maioria dos capixabas, tinha orgulho de ostentar o adesivo Camata no veículo e parei um dia na casa de Marcus, em Ibiraçu. “Ainda tenho que aguentar isso, Maroba? O sujeito vem na minha casa com adesivo do adversário no carro… “ e caímos na risada. Nada mudou para nós. Depois, o próprio Marquinho tornou-se um camatista de carteirinha.

As amizades sobrevivem às divergências políticas, porque a amizade é maior do que a política. Pena que os tempos mudaram. E mudaram tanto que hoje o Espírito Santo chora a morte do maior mito de sua política. Com um tiro disparado por um “ex-amigo”.

Camata nasceu em Castelo, no Sul do Estado, mas muita gente é capaz de jurar que ele era de Marilândia, no Norte do Estado, de tanto que ele falava do lugar recheado de parentes seus.


José Caldas da Costa, jornalista (escrito em 27 de dezembro de 2018, um dia após seu assassinato)

Read More